SIMETRIA é um conceito que atravessa diversas áreas do conhecimento: literatura, poesia, música, arquitetura, física, biologia, anatomia, matemática e, claro, geometria. Além dessas disciplinas, a simetria é um princípio fundamental que permeia a arte, o design, o cinema e a fotografia.
Na NATUREZA, ela é um fenômeno amplamente observado, sendo não apenas esteticamente agradável, mas também crucial para a eficiência e sobrevivência dos organismos. Nos vegetais, padrões simétricos otimizam o uso de espaço e recursos, enquanto, no nível molecular, a simetria é essencial para funções biológicas vitais, como a replicação do DNA. A simetria bilateral, comum entre os animais, e a simetria radial, presente em plantas, exemplificam como as formas simétricas facilitam a interação com o ambiente de maneira harmoniosa. E ambos servem como ferramentas de diversas expressões em artes visuais.
Quando FIBONACCI introduziu a PROPORÇÃO ÁUREA em seus estudos, ele destacou um padrão natural fascinante que se traduz em composições visualmente harmoniosas e equilibradas. Tido como a razão irracional associada à estética proporcional. Representada pelo número irracional ϕ, essa proporção divida aparece em exemplos como a disposição das folhas, as sementes de girassol e as conchas. Essa proporção é facilmente identificado em obras de arte e arquitetura, no entanto, ela não foi "inventada" pelo matemático, justamente por se tratar de um fenômeno natural. Ela foi inserida com veemência na literatura, após estudada profundamente por ele em 1202, mas em 300 aC, o matemático grego EUCLIDES já havia documentado formalmente a proporção áurea em seu trabalho. Ambos nos ajudam a refletir sobre a conexão profunda entre matemática e a percepção humana, criando uma harmonia que ressoa em nosso entendimento do mundo até hoje.
Ao longo dos séculos, a simetria foi um princípio central na ARTE, sendo utilizada para evocar harmonia, equilíbrio e ordem. Desde as civilizações antigas até o Renascimento, ela foi associada à proporção divina e à beleza ideal, simbolizando uma crença em uma harmonia universal. Na modernidade e contemporaneidade, ela continua a ser explorada, ora reforçando a sua atemporalidade e estabilidade, ora desafiando convenções, em reflexo às complexidades do mundo atual.
A percepção humana, conforme descrita pela teoria da GESTALT, é naturalmente atraída por formas simétricas, que são vistas como organizadas e equilibradas. Isso facilita o reconhecimento, a interpretação e a memorização de composições, tornando-as agradáveis ao olhar. No entanto, a quebra deliberada da simetria pode gerar tensão visual, destacando elementos específicos e criando um impacto que chama a atenção.
A simetria também desempenha um papel crucial na SEMIÓTICA, onde funciona como um organizador visual que estabiliza a percepção e facilita a interpretação dos signos. Elementos simétricos tendem a ser percebidos como mais ordenados e harmoniosos, reforçando a clareza e a legibilidade das mensagens visuais. Ademais, a simetria carrega significados culturais e simbólicos associados ao equilíbrio e à ordem, que podem ser explorados para comunicar valores ou evocar emoções. Contudo, aqui, a quebra da simetria também pode ser usada para introduzir contrastes e complexidade, enriquecendo a interpretação dos signos no contexto cultural.
No amplo campo do DESIGN, a simetria é utilizada para criar composições visuais equilibradas e atraentes. Além de facilitar a navegação e compreensão, é processada intuitivamente pelo cérebro humano. No entanto, o design moderno também valoriza a assimetria da gestalt e da semiótica, que traz dinamismo e inovação, resultando em composições visuais mais ousadas e energéticas.
Na FOTOGRAFIA, a simetria é uma técnica poderosa para criar composições equilibradas e visualmente harmoniosas, onde os elementos são organizados de modo que ambos os lados do quadro reflitam um equilíbrio visual, usando a simetria bilateral ou na simetria radial, tal como na natureza. Fotógrafos como Andreas Gursky, com suas paisagens urbanas de grande escala, e Fan Ho, conhecido por suas cenas geométricas de Hong Kong, utilizam a simetria para atrair o olhar do espectador e destacar o sujeito central, criando uma sensação de ordem e perfeição. Michael Kenna aplica a simetria para evocar tranquilidade em suas paisagens minimalistas, enquanto Gregory Crewdson e Henri Cartier-Bresson usam essa técnica para reforçar o equilíbrio visual em suas narrativas fotográficas. Além de sua estética agradável, a simetria pode transmitir mensagens profundas, como equilíbrio ou paz. Mesmo quando há quebra intencional da simetria, ainda faz-se uso dela, usando isso criativamente para adicionar dinamismo e tensão à imagem.
Já na VIDEOGRAFIA, a simetria é uma técnica poderosa que contribui significativamente para o impacto emocional e narrativo de uma produção. Ao direcionar a atenção para elementos centrais da cena, cria-se uma sensação de ordem, estabilidade e harmonia. O uso das mesmas técnicas de composição são eficazes para centralizar personagens, objetos ou criar composições dinâmicas. Videógrafos que dominam essa técnica conseguem estabelecer uma identidade visual forte e coerente, e muitos fazem questão de isso não passe despercebido, mas que enriqueça a experiência do espectador, tornando a narrativa mais envolvente.
No CINEMA, a simetria é frequentemente utilizada como recurso narrativo, como pode ser visto na icônica "one point perspective" de Stanley Kubrick. Em filmes como 2001: Uma Odisseia no Espaço e O Iluminado, Kubrick emprega a simetria para guiar o olhar do espectador, criando um equilíbrio visual hipnótico que pode evocar tanto perfeição e controle quanto desorientação e desconforto. Wes Anderson, por outro lado, faz uso distinto da simetria em seus filmes, como O Grande Hotel Budapeste e Os Excêntricos Tenenbaums. Suas composições visualmente equilibradas não apenas reforçam a estética, mas também servem à narrativa e ao humor, criando uma ordem obsessiva que contrasta com o caos emocional dos personagens.
“Eu tenho uma maneira de filmar as coisas que é meio arrumada, organizada, simétrica. Não acho que seja necessariamente melhor ou pior que qualquer outra maneira, mas é a minha maneira.” - Wes Anderson.
Optar pela simetria na criação artística reflete a confiança do criador na crença no poder expressivo dessa linguagem visual, que, embora enormemente desafiadora, possui um potencial narrativo poderoso. Essa escolha revela a segurança de quem compreende que a simetria, longe de ser apenas uma estética idealizada, é uma ferramenta capaz de intensificar a profundidade e o impacto emocional da obra, exigindo precisão e maestria para ser plenamente eficaz, mas nunca para tentar atingir uma perfeição que não existe ou que só existe na natureza. Seria essa então a intenção de um criador, através de suas expressões e ferramentas artificiais, tentar se aproximar ou celebrar da perfeição natural?
No entanto, para que essa escolha seja bem-sucedida, o criador precisa ter intencionalidade; tentar usar a simetria de maneira arbitrária e não genuína pode resultar em um trabalho banal. O que também não queira dizer que ele não possa obter esse resultado de maneira acidental. A composição visual simétrica requer um tempo filosófico na captura e ainda mais paciência na pós-produção para garantir um resultado satisfatório. Além disso, é necessário um verdadeiro estudo, prática e treino do olhar, que, com o tempo, passa a perceber geometria e simetria em quase tudo que se vê, mesmo sem uma câmera na mão. Portanto, a simetria deve ser uma escolha deliberada, feita com propósito, dedicação, cuidado, e, especialmente, com muito prazer. 1. 11 de Agosto de 2024 - Lisboa, Portugal. ONEDOT® - Todos os Direitos Reservados © 2024
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